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FM sedia Curso de Formação sobre Transplante de Órgãos

A Faculdade de Medicina da UFG sedia até o próximo dia 18 o Curso de Formação de Transplantes de Órgãos, destinado a capacitar profissionais de saúde dos hospitais sobre todos os aspectos que envolvem a captação e o transplante de órgãos.
Cerca de 70 profissionais de saúde representantes dos maiores hospitais goianos - entre eles médicos, enfermeiros, assistentes sociais e psicólogos – participam desde ontem, 16 de outubro, e até o próximo dia 18 do Curso de Formação de Coordenadores de Transplante 2008, promovido pela Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), em parceria com a Central de Notificação, Captação e Doação de Órgãos do Estado de Goiás (CNCDO) e realizado no Teatro Asklepiós da Faculdade de Medicina da UFG.
Esse encontro, idealizado para promover aprendizado sobre os aspectos relacionados ao processo de doação e de transplante de órgãos, tem a duração de três dias com palestras seguidas de debates, discussão de casos e simulação de entrevista e de logística de doação. Seu objetivo é formar coordenadores de transplantes com um conhecimento básico do processo doação-transplante que lhes permita atuar em todas as etapas do processo.
À abertura do encontro, o coordenador da Central de Transplantes do Estado de Goiás, médico Claudemiro Quireze Júnior, fez uma explanação do funcionamento da Central goiana, mostrando sua estrutura e sua performance na captação e transplante de órgãos. Outro ponto alto do curso foi a palestra do presidente da ABTO, médico Valter Duro Garcia, que falou sobre a situação atual dos transplantes no Brasil, também enfocando o modelo brasileiro.
Outro importante item na programação do evento foi a palestra do coordenador da CNCDO de Santa Catarina, Joel Andrade, cuja central é responsável pela melhor estatística do país em doação de órgãos. E também a coordenadora da CNCDO do Ceará, médica Eliana Régia Barbosa, que falou sobre o processo de transplante, a partir da captação e da doação dos órgãos. Da programação consta ainda a abordagem dos seguintes temas: manutenção do potencial doador,  remoção de órgãos, aspectos legais dos transplantes, processo doação-transplante e identificação e avaliação do potencial doador.
E, ainda, morte encefálica, custo benefício dos transplantes, remoção de córneas e banco de olhos (local), ética e transplante, religião e transplante, mídia e transplante, transplante de rim e de pâncreas, transplante de fígado, transplante de coração e transplante de medula. Ao final de cada dia haverá debate e discussão de casos clínicos e no encerramento do curso será feita uma avaliação geral do evento.
 
 
Entrevista
 
Ao final do primeiro dia de trabalhos no Curso de Formação de Coordenadores de Transplante 2008, o presidente da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), médico Valter Duro Garcia, depois de proferir palestra aos participantes, fez uma visita ao secretário estadual de Saúde, Hélio de Souza e logo em seguida concedeu esta entrevista, transcrita na íntegra:
- Em comparação aos outros países, como estão a captação e transplante de órgãos no Brasil?
- Há alguns aspectos positivos no Brasil, comparando-se com outros países e também alguns aspectos negativos. Em relação ao transplante, o Brasil tem uma posição muito confortável, já que todo paciente tem o direito de fazer transplante pelo sistema público de saúde. Não há qualquer restrição para que toda pessoa do País faça um transplante pelo SUS. Além disso, esse paciente tem direito a receber a medicação imunossupressora para evitar rejeição de forma gratuita, pelo resto da vida. Esses são os fatores positivos.
Mas há também os aspectos negativos e o mais importante deles é a nossa baixa taxa de doadores, em relação aos países desenvolvidos. Hoje temos no Brasil 6,5 doadores por milhão da população, o que significa que no ano passado tivemos 1.150 doadores em morte encefálica no País. E isto é muito pouco: a Espanha, que é o melhor país do mundo nessa estatística, tem 33 ou 34 por milhão, ou seja, cinco vezes mais do que nós, pelo menos. Os Estados Unidos têm 24 e a maioria dos países europeus tem de 15 a 20.
 Na América Latina, o Uruguai tem 18, a
Argentina tem 10, ou Chile tem 8 ou 9 e Cuba tem 14, enquanto que nós só temos 6,5, um número muito baixo ainda. É que nossa dimensão territorial é muito grande e o Brasil se comporta como um continente. Por exemplo, em Santa Catarina e Rio Grande do Sul, há 15 doadores por milhão. Já Amazonas, Acre e vários outros Estados  não têm nenhum doador.
 
- Na sua opinião qual a principal barreira, ou principais barreiras a serem removidas para que o Brasil alcance uma posição melhor?
 
- Esta questão é muito importante. Nós temos quatro barreiras  e quatro pilares onde estão alicerçadas nossas doações e transplantes. Quanto aos aspectos legais, o País já tem um arcabouço legal muito importante, portanto isso, neste momento, não é problema. Quantos aos recursos, apesar de que sempre se precisa de verba maior, no momento este também não constitui um entrave. O maior entrave está nos outros dois pilares: a organização e a educação.
Organização porque os hospitais têm de estar capacitados – e esse curso aqui hoje é um bom exemplo – Há também a necessidade de se ter pessoas altamente capacitadas para fazer o diagnóstico de morte encefálica, para entrevistar a família, ter a organização e equipamentos para fazer os testes rápidos tanto sorológicos como de confirmação da morte encefálica. È preciso ter também as soluções de preservação no hospital à disposição, tem de ter as equipes extremamente organizadas e de plantão, pois pode muito bem ter um doador em plena noite de Natal e a equipe precisa estar pronta para atuar. Esses aspectos organizacionais são ainda um problema, em alguns Estados mais e em outros, menos.
O segundo problema que precisa ser trabalhado muito mais é a educação, ou seja, a negativa da família em doar é porque não entende o que é morte encefálica, porque pensa que sua religião não permite, porque pensa que podem mandar os órgãos para outro país, porque foi maltratada no hospital durante a internação do seu parente etc. Por isso tudo a questão da educação ainda é um aspecto que precisa ser muito bem trabalhado, não só junto à família mas também por meio da mídia.
 
- Com relação à Central de Transplantes de Goiás, parece que ela já teve um desempenho muito melhor do que tem hoje. O que o senhor acha que pode ser feito para que a política de doação e transplante de órgãos seja mais eficiente?
 
Bem melhor, é verdade. O que aconteceu, não sei, não posso dizer. O que tem de se fazer para melhorar é muito importante. Tivemos hoje uma reunião com Secretário Estadual de Saúde e o primeiro ponto mais importante é, sem dúvida, que a Central tenha apoio político. Sem o apoio do Secretário, ela não tem força nenhuma, não tem poder nenhum. O Secretário hoje foi muito claro em nos dizer que está apoiando, vai apoiar a Central e seus projetos. Já na semana que vem haverá uma reunião do Coordenador da Central com o Secretário para discutir os projetos a curto prazo. Isso me parece uma vontade política do governo estadual e se há essa vontade política – o que me parece que tem – aí então vai se qualificar um pouco mais a Central, contar com mais profissionais, pois ela só tem um médico.
 Aliás, a Central de Goiás é a única do Brasil que só tem um médico, precisa ter de dois a três pelo menos, precisa treinar mais o pessoal, promover vários cursos, as comissões dos hospitais precisam estar bem afiadas, entender bem o processo e ser realmente atuantes. Tem de ter laboratório para fazer exame de sorologia a qualquer momento, cursos para ensinar como entrevistar as famílias, o que explicar a elas. Eu acho que nesses próximos seis meses Goiás pode dar uma virada muito importante e a partir de 2009 começar a ter resultados positivos.
 Hoje Goiás está com apenas dois doadores por milhão de população e esta é uma posição muito desconfortável, principalmente para os pacientes, que têm uma chance muito menor de fazer o transplante que precisam do que se morassem em outro Estado. Mas isso pode melhor rapidamente e a nossa idéia é estabelecer para Goiás e outros Estados que estão nessa faixa do 2 a 3, chegar em três anos a 5 doadores. Então no caso de Goiás, mais do que dobrar, vai passar a ficar próximo do índice que tinha em 2003 e 2004 e a partir daí, a cada ano aumentar 1,5 por milhão da população. Esta é a meta para Goiás.
 
-Como o senhor vê que os hospitais universitários, como o nosso Hospital das Clínicas, podem fazer para atuar efetivamente na captação e transplante de órgãos?
 
- Os hospitais universitários são muito importantes nesse processo, pois têm o poder de formar as pessoas que vão trabalhar no futuro. Por isso são tão importantes que acho que neste momento o primeiro papel deveria ter uma cadeira, uma disciplina optativa sobre doação e transplante, como já existe em Porto Alegre e se começou em  Salvador. Esse é o primeiro ponto, pois na maioria dos casos, os currículos são muito antigos e não contemplam essa área.
Num segundo momento, é preciso que haja transplantes nesses hospitais. Aqui se difunde o conhecimento, aqui se faz ciência, então aqui tem de ter transplantes de rins, de fígado daqui a alguns anos, de coração e de pulmão, porque aqui serão treinadas as pessoas que vão dar continuidade a essa política fora. Então é decisivo o papel da Universidade, tanto na difusão do conhecimento teórico como na aplicação dos programas. E através desses programas, beneficiar a população, preparando os alunos para atuarem no futuro como beneficiadores da população.

Source: Imprensa/FM/UFG